UNIVERSIDADE DE
SÃO PAULO
FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO
LABORATÓRIO DE NEUROANATOMIA & NEUROPSICOBIOLOGIA
Alguns Aspectos Elementares da Organização Geral do Sistema Nervoso Central e Periférico
O sistema nervoso é um todo e apresenta-se coberto por três meninges, a dura-mater, a aracnóide e a pia-mater. Sua divisão em partes consiste apenas em um meio bastante didático para melhor abordá-lo e estudá-lo. Por ser um sistema extremamente frágil e nobre, sua região central encontra-se protegida pelo esqueleto axial (do grego, áxon=eixo), formado pela caixa craniana e pela coluna vertebral. Dentro da caixa craniana encontra-se o encéfalo (do grego egképhalos=dentro da cabeça); no canal vertebral situa-se a medula espinhal.
A unidade funcional do sistema nervoso consiste no neurônio, uma célula excitável, especializada na condução de estímulos. 0 neurônio apresenta uma dilatação central, o corpo ou soma (onde se encontra o núcleo), com uma arborização de finos prolongamentos (os dendritos), e um longo eixo (axônio) que fará contato com outros neurônios e outros tecidos (por exemplo, muscular). A forma com que o sistema nervoso se nos apresenta deve-se a uma organização fundamental de seus neurônios e células de sustentação e defesa, as chamadas células da glia (que, em grego, significa cimento). Segundo a disposição dos prolongamentos dos neurônios ou de seu corpo celular, surgem as diversas estruturas neurais, organizadas de um modo bastante peculiar: Os somas podem originar núcleos (aglomerados mais ou menos esféricos), como o núcleo rubro; córtices ou pálios, organizações mais laminares, em forma de casca (do latim, cortex=casca) ou de manto (do latim, pallium=manto), como o córtex cerebral e cerebelar; substâncias (aglomerados mais amplos, maiores que um núcleo, mas ainda circunscritos a um determinado local do neuroeixo), como a substância negra, a substância cinzenta periaquedutal; como faixas entre outras estruturas nucleares on conectivas, como a zona (do latim, zona=faixa) incerta e o claustrum (do latim, claustra=clausura); como colunas ou cornos (como ocorre na medula espinhal), como as colunas anteriores, posteriores e intermédio-laterais da medula espinhal; ou como complexos (uma reunião de núcleos), como o complexo amigdalóide, o complexo olivar inferior. Às vezes, um núcleo pode se apresentar na forma muito característica de algum objeto, fruta ou animal, e recebe um nome bastante sui generis: Por exemplo, pode envolver um outro núcleo esferóide, na forma de uma casca, o conjunto lembrando uma noz. É o caso do putamen (ipsis litteris do latim, putamen=casca da noz) em relação ao globo pálido.
0 núcleo pode ser alongado, com uma extremidade volumosa e outra mais fina, lembrando um cometa, por exemplo, o núcleo caudado, com sua cabeça e cauda. Dois núcleos podem se associar anatomicamente e se apresentar na forma de uma lente, como ocorre ainda com o putamen e o globo pálido, formando o núcleo lenticular (do latim, lens=lente), ou a estrutura pode se apresentar com a forma peculiar de um cavalo marinho, como é o caso do hipocampo (do grego, hippocampos, pelo latim hyppocampus=cavalo marinho), visto em corte transversal. Essa estrutura pode se apresentar ainda com a forma de chifres de carneiro (cornos de Amon). Quando esses aglomerados neuroniais se superficializam no neuroeixo, são denominados de modo diverso: A superficialização do complexo olivar inferior recebe a designação de oliva (do latim, oliva=azeitona ), e a superficialização do núcleo grácil, por exemplo, recebe a denominação de tubérculo grácil (do latim, tuberculum=pequena saliência). Os núcleos mamilares, do hipotálamo, por sua vez, são tão superficiais que se apresentam, quando observamos a face inferior do cérebro, sob a forma de duas estruturas suavemente arredondadas, lembrando-nos a forma de mamas, e recebem a denominação de corpos mamilares. 0 termo "corpo" (do latim, corpus=corpo) designa estruturas muito proeminentes, sejam formadas por aglomerados de somas neurais ou por seus prolongamentos, sejam formadas por conexões entre neurônios. Por exemplo, os corpos quadrigêmeos (estruturas gêmeas), do mesencéfalo dorsal, são formados por quatro estruturas que se apresentam na forma de pequenas colinas (do latim, collis=colina; ou seu diminutivo "colliculus"), os colículos superiores e inferiores. 0 corpo caloso apresenta-se como um proeminente feixe de axônios interligando áreas específicas dos hemisférios cerebrais. Se os aglomerados de somas neuroniais situam-se fora do neuroeixo, recebem a designação de gânglios (do grego gágglion, pelo latim, ganglion= estrutura abaulada).
As projeções axoniais dos neurônios também se organizam de modo bastante peculiar, formando os nervos (do latim vulgar nervus=calcado em nervi =músculos, também podendo ser traduzido como corda), cordões esbranquiçados que se projetam para fora do neuroeixo, ou para ele se dirigem e com ele se conectam. Quando perfazem trajetos dentro do neuroeixo, recebem nomes diferentes, como de tratos (do latim, tractus=tração), conjunto de grande número de axônios, com origem e final comum, como o trato córtico-espinhal anterior, com origem no giro pré-central e destino no corno anterior da medula espinhal (em inter-neurônios ou diretamente no neurônio motor alfa). Quando essas projeções são mais modestas, recebem o nome de fascículos (do latim, fascis=feixe, mas no diminutivo, on seja, fasciculus), como os fascículos grácil e cuneiforme, localizados dorsalmente na medula espinhal. Uma reunião de tratos e fascículos, forma um funículo (do latim, funiculus= pequena corda).
Assim, o funículo posterior da medula espinhal, por exemplo, é formado pelos fascículos grácil e cuneiforme, um à direita e outro à esquerda do sulco longitudinal posterior. Algumas vezes, as projeções axônicas se organizam de modo a se assemelharem a fitas (em latim, lemniscus), como se dá com o lemnisco medial, lemnisco espinhal, lemnisco lateral e lemnisco trigeminal. Se as projeções axoniais, em seu trajeto, têm que percorrer um estreitado espaço entre núcleos diversos, por exemplo no diencéfalo, sua disposição colunar passa adquirir um aspecto laminar, e como de certo modo envolvem um ou mais núcleos, recebem o nome de cápsulas, como a cápsula interna (que em parte é formada pelas projeções descendentes que consistem nos tratos córtico- espinhal e córtico-nuclear), prensada entre o corpo estriado e o tálamo, a cápsula externa, prensada entre o claustrum e o núcleo lenticular, e a cápsula extrema; esta, prensada entre o claustrum (um núcleo, também "enclausurado" entre duas lâminas e uma estrutura cortical límbica, que não se desenvolveu com a mesma magnitude dos lobos frontal e parietal, permanecendo ilhada sob aquelas estruturas, a ínsula (do latim, insula=ilha). Se as cápsulas são ainda mais fortemente comprimidas, por exemplo, quando seus componentes axônicos percorrem a intimidade de um núcleo, apresentam-se ainda mais finas, e são designadas como lâminas, como a lâmina medular lateral, entre o putamen e a divisão lateral do globo pálido, a lâmina medular medial, entre as divisões lateral e medial do globo pálido, e a lâmina medular interna, entre os núcleos talâmicos. Se as projeções neurais dão-se também em forma laminada, mas contornando uma estrutura esferóide, como o tálamo (do grego, thálamos, pelo latim, thalamus=antecâmara ou leito conjugal), em forma de tiara, recebe o nome de coroa radiada (do latim, corona radiata). Disposições semelhantes podem receber denominações muito significativas, como as radiações tálamo cinguladas, as radiações genículo-calcarinas, etc. Se as projeções neurais dão-se entre os hemisférios, são denominadas de comissuras, como as comissuras anterior, posterior ou epitalâmica, e a comissura das habênulas. 0 corpo caloso consiste na maior comissura do cérebro. Se as projeções neuroniais cruzam o plano mediano em forma de "X", recebem o nome de quiasma (do grego, chiásma=cruzamento em X), como o quiasma óptico, ou decussação (do latim, decussatio=cruzamento), como se dá com a decussação das pirâmides do bulbo. As conexões entre neurônios também podem se superficializar, formando as assim chamadas "estrias", como a estria terminal (conexão entre o complexo amigdalóide e a área septal), ou como a estria medular do tálamo (conectando os núcleos habenulares com a área septal). Algumas projeções neurais podem contornar determinado núcleo ou mesmo fazer um certo dobramento em seu percurso externo ao neuroeixo e recebem o nome de "joelho" ou um adjetivo que o valha, como o que ocorre com o joelho do corpo caloso (sua curvatura rostral), o joelho interno e externo do nervo facial.
Alguns núcleos superficializam-se e se projetam de um complexo, sob forma de joelho, como ocorre com os corpos geniculados mediais e laterais do metatálamo. Uma denominação ainda mais peculiar é a que recebeu o assoalho do IV ventrículo, cuja visão geral, considerando as estrias do IV ventrículo e o óbex (do latim, obex=ferrolho), localizado no vértice inferior dessa estrutura rombóide, lembra uma pena de escrever, repousando no tinteiro: calamus scriptorius (do grego kálamos=pena , e do latim, scribere=escrever). A disposição entre dois núcleos bastante superficiais do epitálamo e suas conexões (também superficializadas) com estrutras mais rostrais, lembram as rédeas de uma carruagem, e aquelas estruturas recebem o nome de habênulas (do latim, habenae=rédeas), ou "pequenas rédeas".
Essa pequena introdução tem por objetivo levar o estudante a fazer associações inteligentes, no estudo da nomina anatomica, ao se curvar sobre os diversos acidentes do neuroeixo, reduzindo, assim, a árdua tarefa de lentas aquisições mnemônicas que podem se tornar, com essa nova tática, mais rápidas e eficientes.
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